Haddad acusa empresas chinesas de “concorrência desleal” com varejo brasileiro

Haddad acusa as empresas chinesas de "concorrência desleal"

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A tributação dos produtos chineses importados é a nova medida do governo Lula para aumentar a arrecadação. E não só isso. Vai de encontro aos interesses dos varejistas lobbystas que há anos pressionavam por uma maior tributação sobre os produtos chineses, alegando “concorrência desleal”.

E quem vem endossando esse discurso é o ministro da Fazenda, Fernando Haddad. Ele mesmo tomou a iniciativa de garantir que as empresas chinesas paguem os impostos dos quais eram isentas. Em entrevista recente à Globo News, o ministro endossou o discurso dos varejistas lobbystas:

“O que se está reclamando por parte de algumas empresas é que está havendo uma espécie de concorrência desleal por parte de alguns sites. Está sendo investigado, e será coibido. O melhor que pode acontecer ao consumidor e à economia brasileira é uma isonomia na concorrência”

disse o ministro.

Causas da suposta “concorrência desleal”

O ministro também elencou quais seriam as situações desagradáveis que a tributação poderia evitar. Ele primeiro aponta o contrabando, provavelmente devido a possibilidade das pessoas desta atividade conseguirem escapar do fisco (roubo!) do estado. O segundo seria o roubo de mercadorias. Mas se isso já ocorre hoje, é devido justamente à ineficiência da segurança estatal.

Por fim, ele aponta para o trabalho “análogo à escravidão”, que daria uma vantagem maior às empresas chinesas. Essa última parte de um mito bastante disseminado (principalmente pelos varejistas brasileiros) de que praticamente todos os trabalhadores chineses trabalham em regime “análogo à escravidão”.

O mito do trabalhador escravo chinês

Muito do mito do escravo chinês vem da ideia de que pelo fato das leis trabalhistas na China não serem tão rígidas quanto no Brasil, os trabalhadores chineses estariam trabalhando como “escravos”. Basta uma pesquisa e consulta com os próprios trabalhadores chineses para verificar que essa afirmação é em grande parte um mito. Fala-se de carga horária maior. Mas não exatamente que as condições sejam piores que as dos brasileiros, como se pode verificar aqui.

Além da maioria deles não trabalhar exatamente em condições piores que os brasileiros, a renda deles tende a ser em média maior que a dos trabalhadores brasileiros. Inclusive uma produtividade até mesmo maior.

No entanto, devido à leis trabalhistas menos rígidas, as empresas ficam livres para estabelecer uma carga horária um pouco maior. Do ponto de vista dos bem intencionados defensores das leis trabalhistas isso pode parecer ruim, mas uma visão mais realista sobre mercado e economia talvez esclareça melhor a questão:

Se estes trabalhadores tivessem opções de trabalho mais vantajosas, eles já estariam trabalhando com isso. Dado o fato que aceitam tais condições, presume-se que outras alternativas, como trabalhar menos, porém também ganhar menos – ou até mesmo estar desempregado – seria uma situação muito pior. Levando em conta as privações que chineses passaram durante o regime socialista de Mao-Tsé Tung, a situação atual é uma grande melhoria em comparação.

Em média os trabalhadores chineses podem até trabalhar mais que brasileiros, mas em média também ganham proporcionalmente mais. E isso acaba compensando a situação para muitos. Em comparação, brasileiros podem ser mais “protegidos” pela CLT, mas às custas dos trabalhadores menos produtivos que ficam fora do mercado e das empresas menores, incapazes de cumprir com as exigências da CLT da mesma forma que as maiores.

A CLT possui custos invisíveis que muitos brasileiros sequer levam em conta, enquanto se iludem achando que estão sendo “protegidos” por ela.

Sobre o trabalho “análogo à escravidão”

Ainda sobre a ideia de “trabalho análogo à escravidão”, em geral ele é por si só enganoso. Na maioria dos casos onde alguém trabalhando é apontado como “análogo à escravidão”, ou ele é apenas um trabalho precário, embora sem nenhuma relação com escravidão, ou então é escravidão de fato. A associação desta ideia com o trabalho dos chineses é apenas parte do lobby dos varejistas nacionais que temem concorrência.

Ainda há por último a falsa ideia de que trabalho escravo possa ser tão ou mais produtivo que trabalho livre. Este artigo mostra o quanto este raciocínio não possui o menor respaldo na ciência econômica.

Mesmo nos casos em que críticos apontaram como trabalhos “análogos à escravidão”, os trabalhadores ganhavam em média algo bem próximo do trabalhador CLT brasileiro quase na mesma “proporção”.

“É sobre a arrecadação, idiota”!

O lobby de “concorrência desleal” por parte dos varejistas brasileiros caiu como uma luva nos planos de aumento de arrecadação do governo Lula. E de quebra ainda ganha um grande grupo de apoio para seu governo.

O governo Lula pode falar à vontade que estão apenas buscando “igualdade de condições”, combater supostos crimes facilitados pela entrada dos produtos chineses, mas a verdade é que precisam desesperadamente de mais meios de arrecadação para garantir suas esmolas que garantem sua manutenção no poder.

Mas como já dito neste artigo, tal medida terá um custo alto o consumidor brasileiro. Inclusive os mais pobres, que Lula sempre jurou defender. Medidas como essas gerarão um efeito cascata negativo na economia brasileira e impedirão aos mais pobres que qualquer oportunidade de emprego e renda que poderia ser maior que qualquer esmola do governo eventualmente surja.

A verdadeira raiz da concorrência desleal

De fato o Haddad tem razão. Há uma concorrência desleal entre as empresas brasileiras e chinesas. Mas a causa é o próprio estado. Ao manter a tributação sobre as empresas brasileiras enquanto isenta as chinesas, o estado dá uma larga vantagem à estas últimas.

No entanto, ao contrário do que os lobbystas defendem, a solução não é a taxação dos produtos chineses. Isto seria basicamente punir as empresas chinesas e os consumidores brasileiros. Dois erros não fazem um acerto.

O correto é isentar todas as empresas para que possam concorrer de forma desimpedida, cada qual disputando pela satisfação dos consumidores de acordo com suas possibilidades. Essa é a verdadeira concorrência justa.

Obviamente que os varejistas lobbystas irão ignorar isso e continuar a defender medidas que irão protegê-los de qualquer concorrência. Mas aqueles varejistas que querem concorrer de forma justa precisam entender que é o estado – e não os produtos importados chineses – o seu inimigo.

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