Anarcocapitalismo não é terraplanismo – resposta ao comentário do João Gordo no Flow Podcast

Recentemente, o canal, Whisplash, respostou o trecho de uma participação de João Gordo no Flow, o músico João Gordo, fez vários comentários equivocados sobre o anarcocapitalismo (incluindo que “anarcocapitalismo é terraplanismo”) ao ser questionado sobre o que achava desta ideia. O objetivo deste artigo é rebater as afirmações apresentadas e esclarecer várias dúvidas que João Gordo e outras pessoas similares tem sobre assunto.

Anarcocapitalismo é terraplanismo

O primeiro primeiro comentário feito por João Gordo foi se referindo ao anarcocapitalismo como “terraplanismo”:

Esse negócio de ancap é tipo quem acredita em Terra Plana. Nem conheço, nem sabia que existia. Fiquei sabendo há um tempo e tipo, que absurdo é esse? Para mim é igual Terra Plana.

É comum muitas pessoas afirmarem que o anarcocapitalismo é similar ao terraplanismo, no sentido de que é uma teoria sem fundamento. Geralmente fazem esse tipo de afirmação por estranharem a ideia e fugir daquilo que o mainstream político e acadêmico toma como verdade, geralmente baseado em alguma defesa do estado e do socialismo.

Entretanto, longe de ser alguma forma de terraplanismo, o anarcocapitalismo é uma teoria social baseada em um sólido fundamento ético (mais precisamente envolvendo política e direito) que aponta para o estado como agressão insinstitucionalizada.

Não, João Gordo. Anarcocapitalismo não é para bilionários

Em seguida, João Gordo explica que chegou a ler sobre (não explicando exatamente onde e de quem leu) e faz a seguinte afirmação:

Aí comecei a ler sobre. Você vai ver e os caras são pobres. Não são latifundiários. Não têm empresa que explora o trabalhador e moram num apartamentinho. Podem até ter uma grana, mas é tudo classe trabalhadora. Não tem como você ser ancap se não for bilionário. Quem inventou isso? Eu tenho preguiça de ler. Absurdo essas teorias novas que pintaram aí.

É curioso como João Gordo não cita as fontes de onde tirou informações sobre o anarcocapitalismo. No entanto, pela descrição podemos supor que ou ele se baseou em publicações de anarcocapitalistas em redes sociais, e não os principais autores sobre o assunto. Ou até mesmo sites de críticos da ideia na internet.

Ele já começa errado partindo da ideia, comum aos socialistas em geral, de que pobres e trabalhadores não podem ser favoráveis ao livre mercado capitalista por que supostamente seria prejudicial à eles. A velha idéia de “interesses de classe” apresentada por Karl Marx, de que o socialismo seria favorável aos trabalhadores e que o capitalismo seria favorável aos empresários, e isso levaria a um conflito entre ambas as classes.

Tal raciocínio se equivoca ao achar que o socialismo é sequer benéfico para os trabalhadores. Como o economista Ludwig von Mises bem demonstrou em seu livro ‘Socialismo – Uma Análise Econômica e Sociológica’, o socialismo é economicamente inviável, inclusive para os trabalhadores.

A verdade é que, como os economistas austríacos bem deixaram claro, o livre mercado capitalista é benéfico para os indivíduos em geral, independente de qual classe econômica façam parte. Obviamente que os que geram mais valor para os demais no mercado irão ser mais beneficiados.

No entanto, mesmo que o livre mercado seja o melhor para todos, a afirmação de que os bilionários seriam seus maiores defensores é completamente falsa! Muitos empreendedores, temendo a concorrência, pedem mais intervenção estatal para com isso criar barreiras artificiais que tornam a concorrência mais difícil contra as empresas já bem estabelecidas, principalmente para o lado das novas empresas que surgem no mercado. Tal medida até impede que novas empresas possam surgir.

Como Mises comenta em seu livro ‘Socialismo’:

De fato, nada está mais longe dos interesses particulares dos empreendedores, seja como indivíduos ou como classe, do que defender o princípio da propriedade privada ou resistir ao princípio do Socialismo. Que a introdução do socialismo precisa necessariamente prejudicar os empresários e capitalistas, ou pelo menos seus filhos, não pode ser contestado por aqueles que acreditam que o socialismo implica necessidade e angústia para todos. Nessa medida, portanto, as classes proprietárias estão reconhecidamente preocupadas em resistir ao socialismo. Mas seu interesse não é maior do que o de qualquer outro membro da sociedade e é totalmente independente de sua posição privilegiada. Se fosse possível imaginar que o socialismo seria introduzido de um dia para o outro, então poderia ser dito que os empreendedores e capitalistas tinham razões especiais para desejar manter o sistema capitalista. Eles teriam mais a perder. Mesmo que a angústia resultante da reorganização fosse a mesma para todos, sofreriam mais aqueles cuja queda tivesse sido maior. Mas não é possível imaginar que o socialismo será introduzido tão rapidamente; e se assim fosse, é possível supor que os empreendedores, em razão de seu conhecimento especializado e capacidade de assumir responsabilidades, ocupariam, pelo menos por algum tempo, posições privilegiadas dentro da organização socialista.

O empreendedor é incapaz de sustentar seus netos e bisnetos, pois é característico da propriedade privada dos meios de produção sob o sistema capitalista que ela não crie nenhuma fonte permanente de renda. Cada fortuna precisa ser renovada pelo esforço. Quando o senhor feudal apoiou o sistema feudal, ele estava defendendo não apenas sua propriedade, mas a de seus descendentes. Mas o empreendedor no sistema capitalista sabe que seus filhos e netos só sobreviverão diante de uma nova competição se conseguirem se manter sua base como diretores de empreendimentos produtivos. Se ele está preocupado com o destino de seus sucessores e quer consolidar sua propriedade para eles de uma forma contrária aos interesses da comunidade, ele terá de se tornar um inimigo da ordem social capitalista e exigir todo tipo de restrição à competição.
Mesmo o caminho para o socialismo pode parecer-lhe o melhor meio para isso, desde que a transição não ocorra muito repentinamente, pois ele pode esperar uma compensação contra a expropriação para que, por um período mais longo ou mais curto, o expropriado desfrute de uma renda segura em lugar da incerteza e da insegurança que é o destino dos donos de um empreendimento. A consideração por sua própria propriedade e pela propriedade de seus sucessores pode, portanto, incitar os empreendedores a apoiarem, em vez de se oporem, o socialismo. Ele precisa acolher todos os esforços que visam suprimir fortunas recém-criadas e recentemente desenvolvidas, especialmente todas as medidas destinadas a limitar qualquer coisa na natureza da liberdade econômica, porque garantem a renda que, de outra forma, precisa ser obtida pela luta diária, desde que a competição não seja restrita — porque excluem novos concorrentes.

Resumindo: apesar do livre mercado capitalista ser o melhor modo de produção para todos em geral, alguns indivíduos, inclusive grandes empreendedores, podem defender políticas econômicas que sejam favoráveis à eles em detrimento dos consumidores, trabalhadores e empreendedores concorrentes, mesmo que a curto prazo.

Não, João Gordo. Anarcocapitalistas não são apenas “moradores de apartamentinho de classe média”

João Gordo também repetiu o velho estereótipo de que anarcocapitalistas são “mimados de apartamento”. Há anarcocapitalistas de todo o tipo. Pobres, ricos. Trabalhadores e empreendedores. O anarcocapitalismo é uma ideia que não se restringe a um grupo ou classe social específica.

Tal acusação é uma tentativa infantil e patética de desmerecer os anarcocapitalistas com o velho estereótipo de pessoas egocêntricas, medíocres e que ignoram a realidade ao seu redor. Em geral isso vêm de pessoas que acreditam serem mais esclarecidas sobre a realidade social (ignorando, é claro, os efeitos das próprias idéias que defendem).

João Gordo também afirma que procurou informações sobre, mas não cita nenhum dos principais autores anarcocapitalistas. Como dito anteriormente, ele provavelmente teve contato com anarcocapitalistas com pouco entendimento sobre o assunto ou até mesmo com conteúdos que criticam a ideia (geralmente com afirmações infundadas). Caso ele tivesse tido contato com boas fontes dos principais autores sobre o assunto ao menos teria tido a oportunidade de ver o quanto suas afirmações são completamente desconexas do que é o anarcocapitalismo. Mesmo que insistisse em seguida com as mesmas afirmações infundadas.

Conclusão

João Gordo, assim como muitos críticos do anarcocapitalismo em geral, são completamente alheios a qualquer entendimento sobre tal ideia. No entanto, dado o fato de que pessoas como ele possuem grande alcance, é importante que esclarecimentos sejam feitos, já que faz parte dos objetivos deste site levar as ideias libertárias/anarcocapitalistas adiante para o público.

Caso tenha dúvidas sobre o libertarianismo e o anarcocapitalismo, leia o livro O Alvorecer da Liberdade: O Que é A Liberdade, da Universidade Libertária. A melhor introdução ao tema já feita no Brasil!

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