A PEC das Praias, que começou a ser discutida no Senado na última semana, vem gerando debates acalorados sobre o tema. A discussão sobre a PEC chegou até mesmo a gerar uma troca de farpas entre o jogador de futebol Neymar e a atriz global Luana Piovani. Muitos até se preocupam com a possibilidade de tal medida restringir o acesso de banhistas às praias.

Como o libertarianismo abordaria essa questão?

O que diz a PEC

A PEC das Praias, de autoria do Deputado Federal Arnaldo Jordy (CIDADANIA/PA), visa a privatização de terrenos próximos às praias. Isso significa que as praias em si não serão privatizadas, ao contrário do que foi falado pelos críticos da PEC.

A PEC também visa a “regularização” do Complexo Marítimo.

Segundo o relator da PEC no Senado, o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ), a medida pode facilitar o registro fundiário e também gerar empregos. O relator apontou que a motivação da PEC é um “sentimento municipalista”.

Segundo o senador:

“Os prefeitos conhecem mais a situação dos municípios do que nós aqui do Senado. É um fato: a PEC não privatiza praias”

O senador Esperidião Amin (PP-SC) seguiu Flávio Bolsonaro em sua crítica ao entendimento dos opositores de que a PEC poderia privatizar as praias e permitir seu cercamento. Ele disse que toda a legislação ambiental é federal. Segundo Amin, não há uma linha no texto da PEC que poderia permitir a privatização das praias. Ele disse, no entanto, que há pontos na proposta que precisam de mais debate. O senador ainda afirmou que a PEC permite a descentralização e criticou o que chamou de “centralismo” de gestão e decisões.

Críticas a PEC das Praias

Mesmo que a PEC não vise a privatização das praias, muitos mostraram oposição à medida por acreditarem que ela poderia levar a tal desfecho. Para a presidente da Comissão de Meio Ambiente (CMA), senadora Leila Barros (PDT-DF), a transferência de propriedade pode afetar a função dessas áreas na mitigação das mudanças climáticas.

Para o deputado Túlio Gadelha (Rede-PE), a PEC chegou em uma péssima hora, em meio à polêmica do desastre “climático” que assevera os gaúchos. Ele afirma que, uma vez que os terrenos próximos às praias são um terreno da União, eles são um terreno do povo e que somente a União deve geri-los. Ele também diz que nos municípios há mais barganhas políticas, o que poderia favorecer os problemas ambientais.

O deputado também reconhece que no texto da PEC não há nenhuma menção à privatização. Ainda assim, o parlamentar acredita que a privatização dos terrenos poderia levar a tal desfecho, já que os proprietários dos terrenos poderiam bloquear o acesso às praias.

Houve também um movimento nas redes sociais contrário à PEC, liderado por surfistas, influencers e ativistas, que vêm liderando uma forte campanha em oposição à proposta entre os internautas. Ao todo, houve 47 mil votos contra a PEC registrados no portal e-Cidadania, enquanto até agora só existem 800 votos a favor.

Treta entre famosos

A discussão sobre a PEC tomou proporções ainda maiores após o jogador de futebol Neymar Jr e a triz global Luana Piovani terem uma troca de farpas sobre o assunto nas redes sociais. Após tomar conhecimento de que Neymar havia fechado contrato com uma construtora para um condomínio à beira-mar, a atriz passou a acusar o jogador de se beneficiar com a PEC.

Luana Piovani chamou Neymar de “péssimo cidadão”, o que indignou o atleta que, em contrapartida, a chamou de “louca”. Desde então, vários internautas e influencers tomaram parte na discussão, apoiando um ou outro dos famosos envolvidos na discussão.

Os verdadeiros motivos de oposição da esquerda à PEC

A oposição da esquerda à PEC se deve em primeiro lugar à sua fé absoluta no monopólio do estado sobre todos os recursos. Para a esquerda, somente o estado deve e pode gerir recursos naturais com responsabilidade. O que historicamente se mostrou não ser o caso.

Mas, para a esquerda, manter essa narrativa é importante para alcançar seu objetivo de maximizar o controle do estado sobre os espaços físicos e os recursos. Mesmo suas preocupações ambientais estão respaldadas nisto, já que já partem do credo de que somente o estado pode lidar com tal questão.

Uma visão libertária sobre a PEC das Praias

O libertarianismo, mais especificamente o austro libertarianismo, defende o direito de propriedade de cada indivíduo sobre seu próprio corpo e seus meios de ação, como bem demonstrado pelo filósofo e economista Murray Rothbard.

No entanto, há condições necessárias para que se deem as devidas apropriações sobre os recursos. Em primeiro lugar, para que um determinado recurso seja devidamente apropriado, ele deve ser sem dono. E caso já possua dono, tal recurso só pode ser adquirido via transferência voluntária do bem do antigo proprietário para o novo. Isso pode ser feito na forma de uma troca comercial ou de uma doação, ou herança.

Mas, e no caso de recursos que, mesmo não tendo um proprietário, são de uso comum por parte de várias pessoas? O filósofo e economista libertário Hans-Hermann Hoppe apresenta uma solução para essa questão. No capítulo 5 do seu livro ‘A Grande Ficção‘, intitulado ‘Da propriedade comum, pública e privada e a razão da privatização total‘, onde ele lida com a forma correta de se privatizar algum recurso ou espaço físico.

Neste mesmo capítulo, além de tratar da privatização de recursos de uso comum, Hoppe trata também da privatização de estatais. Neste artigo, irei me atentar somente ao primeiro caso, mas sugiro que leia o capítulo na íntegra. É de grande importância.

Mas continuando: neste capítulo, Hoppe explica que, no caso da apropriação de espaços físicos e recursos que já eram de uso comum por vários indivíduos, a apropriação só é possível com o conscientismo das pessoas que já faziam uso de tal recurso. E não apenas isso. O novo proprietário deve respeitar o uso que os indivíduos já faziam antes de tal recurso.

Nas palavras do próprio Hoppe:

“Como é possível que ruas até então sem dono sejam privatizadas sem gerar conflitos? A resposta sucinta é que isso pode ser feito desde que a apropriação da rua não viole os direitos previamente estabelecidos dos outros proprietários de utilizar essa rua “gratuitamente” (em termos jurídicos, mitigação ou servidão). Todos os indivíduos devem continuar tendo a liberdade de andar pela rua para ir de uma casa à outra, andar pelo bosque e ir até o lago, assim como antes. Todos devem continuar com seu direito de passagem. Desta forma, ninguém pode alegar ter ficado em pior situação com a privatização da rua.”

Como Hoppe bem explica, esta solução não é apenas a mais justa, mas também a mais efetiva no que tange à boa manutenção dos recursos:

“Em termos práticos, o apropriador — com o intuito de materializar e validar a sua declaração de que a rua até então de todos agora é privada, e que ele (e ninguém mais) é o proprietário dela —, seja ele quem for, deve realizar algumas manutenções e trabalhos de reparo ao longo de toda a rua. Ato contínuo, sendo agora o proprietário, ele — e ninguém mais — pode desenvolver e aperfeiçoar a rua da maneira como achar melhor. Ele determina as regras e regulamentações relacionadas ao uso da sua rua de modo a evitar todos os tipos de conflito. Ele pode, por exemplo, construir uma barraca de cachorro-quente na rua, e proibir que outros façam o mesmo; ou ele pode cobrar taxas para fazer a coleta do lixo. Em relação a forasteiros, o proprietário da rua pode determinar regras de entrada para estranhos não convidados. Último, mas não menos importante, sendo o proprietário da rua, ele pode vendê-la para qualquer outra pessoa (com todos os direitos de passagem previamente estabelecidos permanecendo intactos).”

No mesmo capítulo, Hoppe explica como a solução alternativa, a “propriedade pública” sobre tais bens, leva a uma péssima gestão, verdadeira tragédia dos comuns.

Conclusão

De fato, não cabe ao estado decidir o que deve ou não ser apropriado e em quais condições. Por um lado, os críticos da PEC têm suas razões em se preocupar de que a privatização proposta pela PEC leve à violação dos direitos apresentados pelo Hoppe como parte da condição para a privatização dos bens de uso comum.

Por outro lado, os críticos da PEC (em geral, de esquerda) também pecam por depositarem sua fé na “superioridade” da gestão estatal sobre tais recursos (que já sabemos não ser o caso).

Por fim, a solução apresentada por Hoppe é a única solução justa e efetiva para tal tipo de questão e similares.


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