Refutando o acórdão do STF sobre homeschooling

Introdução

Recentemente o STF colocou um fim na discussão sobre a legalidade da educação domiciliar (homeschooling). A decisão foi proferida em 12.09.2018 e ela trouxe vários pontos interessantes, dentre eles de que os “Douto Julgadores” carecem de conhecimentos jurídicos, caso queiram se propor a resolver conflitos.

Será demonstrado como a obediência ao princípio correto (Direito de Autopropriedade) é fundamental para solucionar qualquer problema jurídico. Basta desobedecer a isso e tudo o que vier depois é promoção de contendas.

Tendo isso em vista, não será usado nenhum fundamento constitucional como base para demonstrar que a decisão não só é teratológica, como, também, é fundamentalmente incorreta (inválida). O motivo é simples e será visto adiante: a Constituição Federal é objetivamente errada, já que é uma proposta ética a posteriori, ou seja, nem é universal, nem é necessária e nem é atemporal.

O presente artigo terá como objetivo aplicar a Ética Libertária especificamente ao que foi decidido pelos ministros do STF sobre o Recurso Extraordinário do RE 888.815. Importante salientar que o acórdão não está disponibilizado (ainda) e o que serão atacados são os argumentos dos ministros que foram expostos no próprio site do STF. O presente artigo será atualizado quando o acórdão for disponibilizado.

Panorama Geral

O litígio teve sua origem em um Mandado de Segurança, impetrado pelos pais de uma criança de 11 anos, contra ato da secretária de Educação do Município de Canela (RS). Tal funcionária negou o pedido dos pais para que a criança estudasse em casa e os obrigou a matricular numa rede “regular” de ensino, onde até então havia estudado.

Tanto o juízo de primeira instância quanto o de segunda instância indeferiram o referido remédio constitucional sob o fundamento de que “se não há previsão legal de ensino nessa modalidade, logo não há direito líquido e certo a ser amparado”.

Assim, foi interposto Recurso Extraordinário, que é direcionado diretamente ao STF, sob o fundamento de que as decisões judiciais violaram os preceitos do art. 206, inciso II e III, da CF:

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:


[…]


II – liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;


III – pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;

Segundo os pais, resumir “educar” à “instrução formal numa instituição convencional de ensino” é uma violação às garantias constitucionais, além de ser uma total ignorância sobre métodos variados de ensino.

O referido Recurso Extraordinário foi admitido, isto é, foi recebido após ser verificado que preencheu os requisitos formais de admissibilidade, pelo ministro (e relator do caso) Luís Roberto Barroso. Ele, inclusive, salientou que a educação é um direito fundamental garantido pela Constituição e que a efetivação (art. 208, CF) se dá por cooperação entre Estado e Família, sendo, portanto, um dever conjunto.

Destacou, ainda, que a controvérsia reside em como a educação familiar será efetivada, ou seja, sugerindo implicitamente que tal prática deva ser regulada, já que é uma situação em que o indivíduo se sobrepõe ao Estado.

Foi reconhecida, pelo ministro e pelo Plenário, a Repercussão Geral desse caso, apesar de não ter sido judicializado:

O debate apresenta repercussão geral, especialmente do ponto de vista social, jurídico e econômico: social, em razão da própria natureza do direito pleiteado; jurídico, porque relacionado à interpretação e alcance das normas constitucionais que preveem a liberdade de ensino e o pluralismo de ideias e concepções pedagógicas e à definição dos limites da relação entre Estado e família na promoção do direito fundamental à educação; e econômico, tendo em conta que, segundo estudos o reconhecimento do homeschooling poderia reduzir os gastos públicos com a educação.

Após a exposição desses fatos, o próximo passo será discorrer sobre a ética libertária, pois, somente assim, será possível atacar devidamente os fundamentos usados pelos demais ministros do STF sobre o caso.

A Ética Libertária

A humanidade vive em um mundo de escassez, isto é, um mundo onde conflitos podem existir. O conflito nada mais é quando dois indivíduos, pretendem usar simultaneamente (e de maneira excludente) o mesmo recurso, a exemplo da maçã: João quer comê-la, mas Carlos quer fazer uma torta; ou João segura o braço de Carlos contra a vontade deste, alocando, assim, uma finalidade excludente desse recurso.

É nessa situação, quando existem indivíduos, que problemas éticos (certo e errado) surgem. Tais problemas só podem ser propostos pela argumentação, que nada mais é que uma atividade de troca de proposições com o objetivo de se atingir um valor verdade.

Em um cenário hipotético, onde só há um indivíduo no mundo, tais problemas éticos não podem ser formulados, pois não há conhecimento sobre a existência de outros indivíduos. Não há como definir conflitos nesse cenário e nem há como ocorrer conflitos, já que, em tese, todos os recursos estão às disposição do único ser que habita a vasta região.

Como não é esse o caso do mundo real, diariamente conflitos ocorrem. Todos eles versam sobre escassez. Sendo a Justiça e a Lei qualidades naturais desse cenário, muitas leis (éticas) são propostas para tentar evitar/resolver as contendas. No entanto, nenhuma consegue ser justificada, pois precisam passar inevitavelmente pelo filtro da argumentação.

O simples ato de argumentar já pressupõe que se está utilizando o próprio corpo (um recurso escasso) para que uma finalidade seja atingida. Acontece que, também se pressupõe que os interlocutores reconheçam mutuamente que eles são entidades exteriores a si, isto é, que são autônomas e podem ser convencidas. Sem esse reconhecimento, não há como a argumentação ocorrer.

O que fica implícito nisso tudo, ou, melhor dizendo, no a priori da argumentação, é que existe uma norma impressa nesse descritivo, qual seja, o Direito de Autopropriedade. Este é princípio ético que regula naturalmente tal atividade, isso porque só o fato das partes engajarem em argumentação automaticamente reconhecem mutuamente tal normativo. Há, portanto, uma norma derivada do direito já mencionado: a de não agressão.

É a partir desse reconhecimento que se faz uma síntese apriorística no sentido de que a agressão, quer dizer, o início injustificado de violência, é objetivamente errado, visto que tal ação cessa o reconhecimento do Direito de Autopropriedade. Com esse “não reconhecimento”, a argumentação não pode ocorrer, já que o agressor está alocando (simultaneamente) os recursos da vítima contra a vontade desta.

Qualquer tentativa de negar ou refutar a ética libertária, o argumentador cairá em contradição performativa, dado que só o fato de engajar nessa atividade já implica no reconhecimento mútuo desse direito.

Quanto à apropriação originária dos demais recursos, eles podem ser justificados igualmente pela argumentação, já que ainda subsiste o problema da escassez e dos conflitos. A pessoa precisa agir (usar o próprio corpo) para se apropriar de algum bem, estabelecendo um link objetivo indireto. Como já sugerido, a forma primordial para se estabelecer uma apropriação seria o homesteading (apropriação originária) e a razão disso reside no fato de que “quem chega primeiro não tem como promover conflitos”. Sem homesteading, não há possivelmente como existir trocas voluntárias (apropriação derivada), pois aquele é pressuposto deste.

Qualquer tentativa de negar ou refutar a possibilidade de adquirir propriedades cairá em contradição, pois se estaria argumentando no sentido de defender quem “chegou atrasado”. Ou seja, o argumentador estaria promovendo conflitos com sua proposta ética injustificável.

Para mais informações sobre a Ética Argumentativa, conferir este artigo. Assim, após justificar a ética libertária corretamente pela argumentação, será feito a seguir a devida refutação ao que os ministros sustentaram no acórdão sobre o Recurso Extraordinário, o qual não foi dado provimento.

Ministro Edson Fachin


Para o ministro Edson Fachin, o Estado tem o dever de garantir o pluralismo de concepções pedagógicas e, sendo o ensino domiciliar um método de ensino, poderia ser escolhido pelos pais como forma de garantir a educação dos filhos. O ministro revelou que estudos recentes demonstram que não há disparidade entre alunos que frequentam escola daqueles que recebem ensino domiciliar. Para Fachin, não se pode rejeitar uma técnica que se mostra eficaz, desde que atendidos os princípios constitucionais. Mesmo reconhecendo haver amparo ao pluralismo de concepções pedagógicas, o ministro salientou que o Poder Judiciário não pode fixar parâmetros para que um método possa se ajustar a regras de padrão de qualidade, como exige a Constituição. O ministro votou pelo parcial provimento ao recurso, acolhendo a tese da constitucionalidade do direito de liberdade de educação em casa. Porém, como a medida depende do reconhecimento de sua eficácia, divergiu do relator quanto ao exercício do direito, impondo ao legislador que discipline a sua forma de execução e de fiscalização no prazo máximo de um ano.

Como já exposto, os ministros do STF seguem uma ética totalmente injustificável, qual seja, a constitucional, solidificada pelo Estado de Direito. Toda a argumentação gira em torno do Estado, mas, conforme já explanado, não há como justificar por argumentos que o Leviatã tenha legitimidade, tampouco sobre o que deve fazer.

O motivo disso é simples: o Estado é um vínculo hegemônico, em outras palavras, ele existe por imposição (unilateral, portanto). Isso significa que ele aloca (simultaneamente) os recursos das pessoas de acordo com sua vontade, para fins excludentes. Se você discorda dele ou não sabe que uma lei X existe, é simples: além de não poder alegar desconhecimento das leis (art. 3˚, LINDB), vai ter que obedecer tudo o que for determinado.

Ante o exposto, é objetivamente errado o Estado alocar o corpo das pessoas (bem como seus demais recursos) de forma forçada, a fim de atender finalidades exclusivas, pois se está violando a Ética Libertária (o Direito de Autopropriedade).

Argumentar em favor disso é argumentar em favor da agressão. Argumentar em favor da agressão requer, como pressuposto, o reconhecimento mútuo da Ética Libertária. Quer dizer, há flagrante contradição performativa, já que o meio adotado para defender uma ética (constitucional) requer o reconhecimento de uma Lei que evita agressões.

No caso, o ministro defendeu que “o Estado tem o dever de garantir o pluralismo de concepções pedagógicas”. Para ele, o homeschooling é constitucional, mas precisa de regulamentações sobre a prática. Ou seja, ele defende uma legalização do ensino domiciliar.

Novamente: o ministro caiu em contradição performática. 1) o Estado não tem legitimidade para fazer nada, pois não obedece a ética e nem o meio primordial de apropriação originária. 2) a instituição é agressora por natureza e argumentar em favor de regulamentação ainda é um erro, pois carrega-se implicitamente um dever estatal. 3) a discussão sobre o judiciário ser competente ou não para ditar as regras é totalmente a posteriori e, em seu cerne, está incorreta, dado que o Leviatã não tem legitimidade.

Qualquer tentativa do Fachin a negar ou refutar a ética libertária, cairá em contradição performática, pois o meio usado para tanto requer o reconhecimento do Direito de Autopropriedade. Repita-se à exaustão que o fato de ser constitucional ou não (a educação domiciliar) é irrelevante.

Ministra Rosa Weber

Ao votar com a divergência aberta pelo ministro Alexandre de Moraes , a ministra Rosa Weber lembrou que enquanto a Constituição de 1946 previa que a educação dos filhos se dava no lar e na escola, a Carta de 1988 impôs um novo modelo, consagrado entre outros no artigo 208 (parágrafo 3º), segundo o qual “compete ao Poder Público recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsáveis, pela frequência à escola”. Esse modelo, segundo a ministra, foi regulamentado no plano infraconstitucional por meio da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) e do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que falam na obrigatoriedade dos pais em matricularem seus filhos na rede regular de ensino. A ministra salientou que o mandado de segurança impetrado na instância de origem discute basicamente a legislação infraconstitucional, que obriga os pais a procederem à matrícula dos filhos na rede regular de ensino. E nesse aspecto, a ministra disse que não existe espaço para se conceder o pedido.

A ministra em questão foi mais incisiva e legalista que o Fachin, adotando uma estratégia hermenêutica literal e taxativa, por assim dizer. Baseou-se estritamente no que a Constituição preconiza. Porém, como se verá a seguir, sua linha argumentativa é totalmente pobre, contraditória e sem fundamentos, configurando nada mais, nada menos, que um palpite jurídico.

É irrelevante o que o art. 208 (e todos os seus componentes) da Constituição diz, pois ele não pode ser justificado por argumentos. Nesse dispositivo, defende-se que o Estado deva cooperar com a família dentro da educação dos filhos. O presente artigo desafia qualquer um a justificar como uma instituição que agride pode, simultaneamente, cooperar, sendo que esta palavra, em sua essência, pressupõe a não agressão.

Também não interessa o argumento histórico sobre o que os diplomas constitucionais anteriores dissertavam sobre o tema, até porque história não tem valor epistêmico e, como sugere a ministra, o simples fato do tempo ter transcorrido ao futuro e desencadeado uma mudança legal, não significa que houve uma evolução civilizacional positiva nesse sentido, tampouco significa que a medida é a objetivamente correta.

A ministra, também, defende que as crianças são obrigadas constitucionalmente a se matricularem em uma escola e o motivo é teratológico: porque a Constituição assim determina. Não percebe, a “Douto Julgadora”, que ela está iniciando violência injustificada e alocando, contra a vontade da criança e dos pais (quanto tutores), os seus respectivos recursos escassos. Além disso, essa medida só reforça uma distorção de mercado, qual seja, uma bolha de ensino escolar.

Qualquer tentativa da Rosa Weber a negar ou refutar a ética libertária, cairá em contradição performática, pois o meio usado para tanto requer o reconhecimento do Direito de Autopropriedade.

Ministro Luiz Fux

O ministro Luiz Fux também divergiu do relator e votou pelo desprovimento do recurso. Mas, em seu entendimento, há inconstitucionalidade do ensino domiciliar em razão de sua incompatibilidade com dispositivos constitucionais, dentre eles os que dispõem sobre o dever dos pais de matricular os filhos e da frequência à escola, e o que trata da obrigatoriedade de matrícula em instituições de ensino. Fux citou ainda dispositivos da LDB e do ECA que apontam no mesmo sentido, e até mesmo o regulamento do programa Bolsa Família, que exige comprovação de frequência na escola para ser disponibilizado. O ministro apontou ainda a importância da função socializadora da educação formal, que contribui para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho.

Fux seguiu a mesma linha da Rosa Weber, mas conseguiu ser ainda mais marxista. Salienta-se que o fato de algo ser constitucional ou não, é totalmente irrelevante, isso porque a Constituição é uma proposta ética que não pode ser justificada por argumentos pelo seguinte: 1) ela não é libertária e 2) porque se apresenta como uma Lei a posteriori.

O fato de existir incompatibilidade entre os preceitos constitucionais é uma questão totalmente sem fundamento, já que a Carta Magna não pode ser, por definição, fundamento para qualquer tipo de decisão que carregue, por natureza, a agressão.

O que chama atenção em sua linha de raciocínio foi o ponto da “função socializadora da educação formal”. O que é isso? Não se sabe, mas este artigo pode te dar um norte. Parece que Fux tentou aplicar a função social no aspecto educacional, ampliando seu alcance e dando um caráter de “função social da autopropriedade”. Por esse fundamento, ele está basicamente defendendo por argumentos que é correto a individualidade (e o corpo) das pessoas terem uma função social no que tange à educação formal, qual seja, elas devem ser obrigadas a comparecerem à escola.

Obviamente, não há como justificar argumentativamente que alguém deva ser obrigado a se matricular na escola porque assim a lei deseja, já que o interlocutor cairia em contradição performática no próprio ato, uma vez que o pressuposto para engajar em tal atividade é justamente o reconhecimento do Direito de Autopropriedade.

Ele também diz, implicitamente, que a cidadania e a qualificação do trabalho não podem ser fornecidas tão somente pela família, mas, sim, com ajuda do Estado. Isso já foi apontado como contraditório na sessão da Rosa Weber.

Pelos motivos expostos, qualquer tentativa de Luiz Fux a negar ou refutar a ética libertária, cairá em contradição performática. Não há como possivelmente justificar a agressão, porque são ações excludentes (agredir e argumentar).

Ministro Ricardo Lewandowski

Em seu voto negando provimento ao recurso, o ministro Ricardo Lewandowski seguiu os fundamentos adotados pelo ministro Luiz Fux. Ele ressaltou a importância da educação como forma de construção da cidadania e da vida pública, por meio do engajamento dos indivíduos, numa perspectiva de cidadania ativa. Para Lewandowski, a legislação brasileira é clara quanto ao assunto, afastando a possiblidade de individualização do ensino no formato domiciliar. “A educação é direito e dever do Estado e da família, mas não exclusivamente desta, e deve ser construída coletivamente”, afirmou. O risco seria a fragmentação social e desenvolvimento de “bolhas” de conhecimento, contribuindo para a divisão do país, intolerância e incompreensão.

O raciocínio de Lewandowski foi a evolução do que Fux defendeu e isso foi deveras interessante. Primeiramente, ele não definiu o que vem a ser “educação”, “construção da cidadania e da vida pública”, “engajamento dos indivíduos, numa perspectiva de cidadania ativa”. Pelo contexto do que foi dito, muito se lembra os ensinamentos de Hegel e do próprio conceito de fascismo, que sempre deixou claro que “não há indivíduo sem Estado”.

Para o ministro, todos os termos cercados por aspas no parágrafo anterior carregam conceitos socialistas. Tanto é que ele buscou literalmente afastar “a individualização do ensino em formato domiciliar”. Dentre todos os ministros, até agora ele foi o que mais demonstrou um caráter autoritário e “vermelho”, por assim dizer. O mais irônico é que ele não pode justificar nada disso por argumentos.

Como se não bastasse, novamente insistiu que o Estado deve cooperar com a educação familiar, devendo ser construída coletivamente. Não precisa repetir que isso é injustificável, por ser totalmente contraditório. O ministro parece não gostar muito de diferenças e diversidades, já que ele teme uma fragmentação social que acabe rompendo o país.

Esse último ponto é importante, pois é justamente isso que o Estado teme quando enfrenta o homeschooling: a descentralização da informação. Ele perde a força de seus intelectuais e de seu poder doutrinário em controlar o que todos devem ou não aprender. É uma ameaça que corrobora com a secessão individual, sendo uma das bases desta.

A propósito, não por coincidência, a secessão foi a primeira coisa que a Constituição Federal proibiu, logo em seu art. 1˚. O preâmbulo, apesar de não ter caráter normativo, foi um prólogo para tal feito.

Enfim, os fundamentos do Lewandowski não passam de palpites autoritários que atentam contra a existência e a integridade de qualquer indivíduo. Sua proposta ética é totalmente injustificável, já que ele defende explicitamente a agressão. Qualquer tentativa dele negar ou refutar a ética libertária o fará cair em contradição performática, o que acabará pro expor toda a invalidade de seus argumentos.

Ministro Gilmar Mendes

O ministro Gilmar Mendes também votou pelo desprovimento do RE, destacando a dimensão constitucional da questão, a qual fixa um modelo educacional mais amplo do que o domiciliar ou estatal isoladamente, devendo ser alcançada multidimensionalmente. E ressaltou o custo que a adoção do ensino domiciliar traria para o sistema de ensino, uma vez que exigiria a instituição de uma política de fiscalização e avaliação. Para ele, apenas por meio de lei essa modalidade de ensino pode ser experimentada.

O presente ministro conseguiu elaborar uma decisão extremamente genérica ao abusar do termo “constitucional” e “dimensional”. Pelo o que parece, ele defende que a educação deva ser fornecida, novamente, em cooperação com o Estado. Como já visto, isso é impossível de ser defendido por argumentos.

O ponto mais interessante foi ele “justificar” o proibicionismo da educação domiciliar por um consenquencialismo fajuto: de que iria trazer prejuízos para o sistema de ensino, já que se gastaria muito com políticas de fiscalização e avaliação. Uma decisão preguiçosa que, teve como conclusão, delegar a responsabilidade ao legislativo (já que nunca funciona).

O que o Gilmar não pensou é que, caso ele esteja realmente preocupado com o sistema de ensino e com os gastos públicos, é simples: não imponha nenhum tipo de regra. Deixe para a ordem natural. Apenas vote permitindo a educação domiciliar, ainda que haja proibição legal, pois o que é certo deve ser feito até às últimas consequências. Ele poderia ter inventado qualquer argumento para afastar qualquer empencilho constitucional, mas, por falta de criatividade (ou de conhecimento), não o fez e manteve a visão periférica fechada.

Em outras palavras, seu argumento foi basicamente no sentido de que não deve ser liberado porque o Estado tem o dever de educar; e nem deve sequer ser legalizado, pois isso aumenta os gastos. Presume-se que o “Douto Julgador” tenha elaborado alguma pesquisa de campo sobre orçamentos e demais cálculos financeiros. O presente trabalho tem curiosidade para analisa-los.

Pelos motivos expostos, qualquer tentativa de Gilmar Mendes a negar ou refutar a ética libertária, cairá em contradição performática. Não há como possivelmente justificar a agressão, ainda mais por um argumento consequencialista que é totalmente de cunho utilitário e a posteriori.

Ministro Marco Aurélio

O voto do ministro Marco Aurélio seguiu a mesma orientação e destacou a realidade normativa educacional brasileira para concluir pela impossibilidade do ensino domiciliar. “Textos legais não permitem interpretações extravagantes. Há uma máxima em hermenêutica segundo a qual onde o texto é claro não cabe interpretação”, afirmou. Segundo ele, dar provimento ao recurso extraordinário implica afastar a aplicabilidade de preceitos que não apresentam traços de inconstitucionalidade no ECA e na LDB. Para o ministro, decidir em sentido contrário, com base em precedentes estrangeiros, pode levar a contradizer o esforço da sociedade brasileira para o avanço da educação, trazendo de volta um passado no qual grande parcela dos jovens se encontrava distante do ensino.

Marco Aurélio socorreu-se à hermenêutica para justificar o seu seguimento pela ordem constitucional. Mas a única máxima que existe não é a que ele mencionou, mas, sim, a Ética Argumentativa. O referido ministro se baseou, novamente, na Constituição para respaldar uma decisão sobre educação domiciliar. Fez-se, dentro de argumentos, uma defesa à agressão. Isso não pode ser justificado, como já visto.

Em sua tese, é plenamente correto obrigar que a criança faça parte de algo que ela não deseja. O agressor está alocando os recursos contra a vontade da vítima, sendo que ambos são indivíduos.

Mais uma vez, pouco importa se outros preceitos legais serão decretados inconstitucionais ou não, já que a Carta Magna não tem valor ético algum.

O que chamou atenção em seu raciocínio foi: ele teme entrar em contradição, pois decidir em favor da educação domiciliar iria representar uma contramão da sociedade. Em primeiro lugar, qual foi o critério metodológico para saber se houve avanço ou não? Em segundo lugar, a educação domiciliar é realmente a variável suprema que, caso seja liberada, automaticamente a educação irá entrar em colapso? Se sim, ele poderia demonstrar isso?

O ministro apenas soltou palpites e conveniências sobre o que ele acha que deve ser. Acontece que esse argumento é uma proposta ética e, em seu conteúdo, há uma promoção de conflitos, quer dizer, ele defende a agressão como já mencionado (defende alocar os recursos de terceiros contra a vontade destes).

Sendo assim, além de estar atrasando o avanço da educação (o que é contraditório perante o que alegou), Marco Aurélio também está caindo em contradição performática, haja vista que é impossível justificar por argumentos uma ética constitucional (ele está negando/tentando refutando a ética libertária).

Ministro Dias Toffoli

O ministro Dias Toffoli seguiu o voto do ministro Alexandre de Moraes, no sentido de negar provimento ao recurso, mas não declarando a inconstitucionalidade desse modelo de educação. Ele disse que comunga das premissas do voto do ministro Roberto Barroso e lembrou que, na realidade brasileira, sobretudo na zona rural, ainda é grande o número de pessoas que foram alfabetizadas em casa ou pelos patrões e que nunca tiveram acesso a uma certificação por isso. Citou, como exemplo, seu pai, que foi alfabetizado e aprendeu matemática em casa, com o pai dele, e sua mãe, que ensinou filhos de colonos a ler e escrever e a fazer operações matemáticas. “Essas crianças, hoje adultas, talvez não tenham recebido ainda nenhuma certificação de terem sido alfabetizadas”, assinalou. No caso julgado, no entanto, o ministro destacou a dificuldade de constatar, de imediato, a existência de direito líquido e certo que justificasse o provimento do recurso.

Toffoli não concordou com a inconstitucionalidade, apesar de que não importa, mas ele reconheceu a importância do homeschooling, sobretudo nas zonas rurais em que já acontece tal prática. Ele, inclusive, citou sua infância como exemplo.

Apesar disso, preferiu se ater ao que a Constituição preconiza sobre os requisitos do Mandado de Segurança (direito líquido e certo) e negou provimento ao recurso.

Com esse ato, o ministro defendeu, implicitamente, que a criança deveria ser obrigada a se matricular na escola. Sua decisão é um exemplo de que a experiência não pode ser um norte para tomada de decisões éticas, pois ela é a posteriori.

O posicionamento do referido ministro também cai em contradição performática, pois ele chancela a proibição por fundamentos totalmente legalistas e constitucionais, que já foi demonstrado serem vazios por não obedecerem os critérios da universalidade.

Leis existem para evitar/resolver conflitos. Se há uma contradição interna nesta definição, não se trata de Lei, mas de uma licença para agredir. É o caso da Constituição que acaba por acometer a argumentação de Toffoli, revelando estar perdido sobre o que vem a ser o certo e o errado objetivamente.

Portanto, qualquer tentativa do Toffoli negar ou refutar a ética libertária, o deixará preso em uma contradição prática, já que o fato de engajar em argumentação já pressupõe que tenha reconhecido o Direito de Autopropriedade, isto é, que ninguém deve ser agredido injustificadamente.

Ministra Cármen Lúcia

A presidente do STF também seguiu o voto divergente do ministro Alexandre de Moraes. Ela ressaltou as premissas do relator relativas à importância fundamental da educação, aos problemas relativos a ela na sociedade brasileira e ao interesse dos educandos como centro da discussão. Mas, na ausência de um marco normativo específico que possa garantir o bem-estar da criança, votou por negar provimento ao recurso extraordinário, sem discutir a constitucionalidade do instituto.

Basicamente a ministra seguiu o voto de Alexandre de Moraes, deu uma floreada com conceitos indeterminados, tais como “educação”, “problemas educacionais na sociedade brasileira” e “interesse dos educandos como centro de discussão”.

Não passa pela sua mente que a decisão de todos eles irá prejudicar a vida de uma criança que está envolvida em um método diferenciado e único de ensino. Se se decide pelo uso da força a fim de obrigar o menor a estar em um local que não deseja, sob os métodos de ensino que não deseja, a presente ministra vai acabar por prejudicar a vida dessa pessoa.

Cármen Lúcia ainda levanta o ponto sobre a “garantia do bem-estar da criança”, sendo que ela nem mesmo sabe de quem se trata. Não conhece a sua realidade, nem os valores dessa família. Sequer foi contratada para julgar o caso, muito pelo contrário: foi imposta a julgar, por um vínculo hegemônico, conforme já explanado. O que vem a ser “bem-estar”? É um conceito vago, utilitarista, consequencialista e indeterminado. Uma “solução” a posteriori, resultado de uma ética a posteriori, qual seja, a de ordem constitucional. Ela não pode ser justificada por argumentos, porque carrega em sua essência a agressão, conduta esta excludente em relação ao voluntarismo (argumentação).

Mais um ministro que caiu em contradição performática e irá continuar caindo caso prossiga com a negativa ou a refutação da ética libertária.

Conclusão

Assim, ficou decidido (tecnicamente 8×2, mas na prática 9×1) que o legislativo deve elaborar uma lei sobre a educação domiciliar. Também ficou decidido que qualquer meio de ensino que exclua totalmente o Estado da relação familiar é inconstitucional. A regulação, portanto, se faz necessária de acordo com a argumentação dos ministros.

Como se pôde ver, a não obediência à ética libertária, que é apriorística, resulta em promoção de conflitos, justamente porque não se segue a lógica e a racionalidade. Segue-se um palpite que, convenientemente, nega a razão. Esse palpite concebe uma bolha jurídica, quer dizer, uma bola ética, tornando o certo e errado (conceitos absolutos) totalmente artificiais.

Assim como na Economia o Estado imprime dinheiro, aproveitando-se das características da moeda fiduciária, no Direito o Estado imprime direitos, criando regras a partir do nada, gerando deveres e aumentando exponencialmente a ocorrência dos conflitos. Neste caso não é diferente: existe o impacto econômico sobre a obrigatoriedade em fazer parte de uma escola e existe, sobretudo, o impacto ético, já que todos esses magistrados decidiram, em maioria, pela agressão de uma criança.

Eles concordaram em alocar os recursos do seu próprio corpo para uma finalidade totalmente excludente, qual seja, obriga-la pela força a matricular-se em uma escola.

“Pai, perdoa-lhes porque não sabem o que fazem” – Jesus Cristo

Referências bibliográficas:

CF. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado Federal, 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm> Acesso em: 28 jan. 2019.

HOPPE. Hans-Hermann. Economics and ethics of private property. 2˚. ed. Alabama: Ludwig von Mises Institute, 2006.

N. S. Kinsella. A Libertarian Theory of Punishment and Rights. 30 Loy. L.A. L. Rev. 607, 1997. Disponível em: <h5ps://digitalcommons.lmu.edu/llr/vol30/iss2/4> Acesso em: 28 jan. 2019

LINDB. Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro. Brasília, DF, Senado Federal, 1942. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del4657.htm> Acesso em: 28 jan. 2019.

STF. Supremo Tribunal Federal. STF nega recurso que pedia reconhecimento de direito a ensino domiciliar. Disponível em: <http://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=389496> .Acesso em: 28 jan. de 2019.

___. Recurso com repercussão geral discute direito dos pais de educar filhos em casa. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=293490&caixaBusca=N> .Acesso em: 28 jan. de 2019. ___. Andamento processual RE 888815. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=293490&caixaBusca=N> .Acesso em: 28 jan. de 2019.

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