Escrito por: Pedro Micheletto Palhares (@DevilSSSlayer)
Revisado por: Paulo Costa (@PauloDroopy)
Bem-vindos a mais um artigo no qual eu irei discorrer sobre teoria econômica. Devido ao meu atual estado de limitação tecnológica, farei, inicialmente, deste artigo um bate papo, no qual explicarei como funciona o orçamento do governo, suas limitações, e como a renda básica universal (que será chamada de UBI para encurtar) funcionaria na prática e suas consequências. Meus caros, entendo que esta proposta é atrativa para muitos, porém, em nossa vida, temos que nos deparar com limitações que a natureza nos impõe, e não importa o quanto a ortodoxia relativize a ciência econômica com o new thinking, a escassez é a base para qualquer estudo de economia, e, tal como uma lei da natureza, ignorá-la implica em consequências catastróficas que não podem ser ignoradas, dito isto, vamos começar nossa exposição.
A UBI tem como proposta garantir uma renda pessoal mínima para toda sociedade através do governo. Parece uma ótima ideia no papel não? Porém, precisamos primeiro estipular a quantidade que será paga para cada cidadão indiscriminadamente [digamos m unidades monetárias (m minúsculo pois se refere à quantidade de moeda nos encaixes individuais e não à quantidade total de moeda em circulação)] e como faremos para custear esse benefício, tal como o que implica esse benefício na prática.
Definido um número qualquer de unidades monetárias, estabelecidos por critérios do que o governo considera necessário ou essencial, nos deparamos com outra pergunta, como iremos arcar com os custos do benefício? Pois bem, segundo a teoria macroeconômica, o estado possui 2 formas de obtenção de renda:
Política Fiscal (Impostos e tributos)
Política Monetária (Impressão de papel moeda e meios de pagamento)
(AMBAS PODEM SER EXPANSIONISTAS OU CONTRACIONISTAS, MAS NÃO ENTRAREMOS NOS NUANCES)
Na primeira política, a fiscal, o estado pode cobrar tributos diretamente (na renda, e.g imposto de renda) e indiretamente (sob o consumo) já os impostos podem ser progressivos (sua proporção aumenta conforme a renda) ou regressivos (proporcionalmente menor conforme a renda aumenta).
A política fiscal, porém encontra uma grave limitação, que é representada pela curva de Laffer.
À luz da teoria econômica, podemos compreender esta curva da seguinte forma: conforme a taxação progride, os custos da produtividade aumentam, gerando um desincentivo à produtividade, acarretando em uma queda no arrecadamento (pois a maior parte de concentração de renda para custear o benefício se encontra nos setores mais produtivos ou protegidos por regulamentação) conforme houver um aumento da tributação após o ponto ótimo (na prática, esse ponto ótimo não existe, pois cada agente reage de forma diferente aos graus diferentes de desincentivo, fazendo com que o efeito ocorra até mesmo antes desse ponto ótimo em menor grau), a arrecadação diminui, não entraremos nas questões éticas aqui envolvidas, apenas uma análise crua do que isso implica, ao taxar a produtividade, sendo através de taxação progressiva (para obter maior renda para custear esse benefício), há um problema em obter a quantidade monetária necessária para bancar o benefício que é diretamente proporcional à densidade demográfica do país ou estado em que a política for adotada [pois aumenta o custo total do benefício per capita (Preço do benefício * Quantidade de beneficiários)], assim como o desincentivo para a produção e incentivo ao consumo, irá aumentar a escassez relativa dos bens consumidos e posteriormente gerar inflação, aumentando a quantidade monetária necessária para adquirir os bens.
Por conta disso se fará necessário um aumento na UBI para, digamos m + n, esse aumento novamente vai aumentar os incentivos do consumo e diminuir os incentivos de produção, até um ponto em que a mera arrecadação via impostos seja insuficiente por se tornar cada vez menor, devido à diminuição da produtividade.
Vejamos então a segunda ferramenta orçamentária, a política monetária:
As ferramentas de política monetária são a taxa de juros, depósitos compulsórios nos caixas do banco central pelos bancos comerciais, emissão de papel moeda ou afrouxamento quantitativo (geralmente de moeda digital como no banco central europeu) e comercialização de títulos públicos.
Pois bem, no caso de financiar a população com uma renda mínima, precisaremos aumentar seus encaixes, para tanto, focaremos unicamente na questão monetária e não crediticia propriamente dita, ou seja, emissão de papel moeda para aumentar os encaixes da população com a quantidade y = m + (i)n, sendo y a renda, e i um índice relativo à quantidade de reajustes na renda mínima decorrentes da inflação (que, na realidade é relativa e não agregada, mas vamos considerar a quantidade de aumentos constantes no IPCA neste caso, imaginando uma economia uniformemente circular, ceteris paribus, na qual há uma variação fixa n (no IPCA, cujo número de variações é representado no índice i de reajustes de n) para facilitar o exercício).
Ora, o efeito aqui causado é o mesmo, porém irá mais longe a medida em que:
(1) Os beneficiários não irão custear diretamente o próprio benefício da UBI.
(2) As limitações da arrecadação não estão mais presentes.
Disso se conclui que a UBI só pode ser efetivamente financiada por impressão de papel moeda ou crédito, portanto, analisarei novamente os prováveis efeitos gerados sem a limitação da curva de Laffer.
Sem entrar no mérito dos efeitos das flutuações cíclicas (pois aqui não cabem as demais ferramentas de política monetária supracitadas para uma política expansionista completa que também infla o capital e inicia uma flutuação cíclica, mas elas podem ocorrer na medida em que, pelo aumento das vendas, o cenário de impressão de moeda e aumento da demanda sirva de incentivo para a produção e para o relativo aumento do capital, se anula em certo grau o desincentivo causado pela desutilidade do trabalho ao receber uma renda mínima e à medida em que não mais se necessita custeá-la. Eliminando mais um desincentivo e, ceteris paribus, considerando que não há outros incentivos de taxa de juros e crédito para expansões maiores, vemos que, apesar do incentivo a expansões causada pelo aumento da demanda, elas não se sustentam devido à desproporcionalidade deste aumento e às limitações temporais dos processos indiretos explicadas pela teoria do capital, exatamente como é descrita a flutuação cíclica), teremos um cenário de hiperinflação, visto que, sem desincentivar a produção com tributos (apesar do possível aumento de preços de insumos de produção caso haja um aumento da demanda por eles por parte dos beneficiários), ao custear a UBI com expansão da base monetária ou meios de pagamento, o aumento da UBI em m + (i)n [que não pode ser infinita por razões óbvias (inflação descontrolada)] fará com que os preços subam em decorrência do aumento deste consumo, gerando filas, escassez e constante e exponencial inflação (parecido com o que o Brasil passou durante a hiperinflação antes do plano real).
Voltando ao primeiro caso (custeando a UBI com impostos), caso fosse possível manter o aumento da UBI em função do índice i (relativo aos aumentos no IPCA), poderíamos chegar um ponto em que, devido aos desincentivos à produção, enfrentaríamos uma escassez similar ao tabelamento (fixação/congelamento) de preços em um preço máximo (devido a ambos os cenários se verificar um excedente da demanda sobre a oferta), tal como adicionar um tabelamento de preço máximo em ambas as formas de UBI, com o intuito de conter a inflação, geraria escassez e mercado negro com ágio daqueles produtos tabelados, tal como o aumento das demandas relativas por seus substitutos e posterior aumento de seus preços (exemplo histórico do plano Sarney).
Com essa análise teórica com alguns exemplos empíricos, verificamos a inviabilidade desse programa tão popular tanto entre os liberais, ortodoxos, keynesianos quanto entre os mais ferrenhos anticapitalistas (com exceção dos marxistas ortodoxos que as vêem como medidas pequeno-burguesas que atrapalham o fluxo inexorável da história), portanto, não podemos advogar por uma política de renda mínima sem abrir mão de nosso poder de compra ou gerar a queda na quantidade e qualidade dos bens ao desincentivar a produtividade em maior ou menor grau, espero que tenha ficado claro (quanto aos socialistas de engenharia social, digo que seu programa possui uma impossibilidade prática, pois necessitaria controlar todas as infinitas variáveis que poderiam influenciar no resultado de seus programas) e que não se incorra novamente neste erro.
Leia também: Os Custos Ocultos da Renda Básica Universal